3 de mai. de 2018

O Judiciário mais caro do mundo: lembranças de um congresso


Estes dias tive a honra de participar do I Congresso Nacional de Direito Processual Civil e Empresarial, organizado pela Uninassau em Fortaleza-CE. Em um dos painéis, Ministros do STJ (Juízes Federais) discutiram sobre as contribuições do Direito Material e Processual Civil, incluindo o Min. Marco Buzzi que despertou atenção ao apresentar dados sobre os custos do nosso oneroso Judiciário, além de possíveis soluções para a crise sistemática do mesmo. Tudo bem, já sabemos que o estado brasileiro é caro e deveras ineficiente em tudo aquilo que se propõe a fazer, o Sr. Ministro poderia até pular essa parte, mas é surpresa saber que uma turma de juízes está preocupada com custos vs eficiência, demonstrando assim certa responsabilidade com a coisa pública  - e sim, sei que é triste espantar-se com algo que deveria ser normal.

“O custo da Justiça no Brasil: uma análise comparativa exploratória”, de Luciano da Ros. Infografia: Gazeta do Povo.
Segundo os últimos estudos realizados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), 85 bilhões ou 1,35% de todas as riquezas produzidas pelo Brasil em 2016 foram destinadas ao custeio do judiciário brasileiro. Em relação ao tamanho do PIB, pagamos nove vezes o que Estados Unidos ou Inglaterra destinam à manutenção da justiça, batemos com folga os gastos de qualquer outra nação europeia ou de nossos vizinhos sul-americanos. Em meio a tantos impostos, é como se cada escravo do estado brasileiro contribuinte despendesse anualmente cerca de 500 R$ só para a justiça verde e amarela. Para bem definir o quadro faço a seguir o uso da imagem que o próprio Min. Marco Buzzi utilizou em sua apresentação.

Survival of the Fattest - Jens Galschiøt
Em termos de orçamento público, como diabos uma sociedade chegou a este ponto? Por hora deixemos de lado fatores como governo, corrupção e a politização do judiciário e nos preocupemos em delinear apenas as principais causas dos gastos com a justiça. Culturalmente carregamos uma série de mazelas de convívio social e uma delas é que somos o país do "vou te processar" equivalente também ao "converse com meu advogado". Inúmeros casos congestionam nossos tribunais com questões/casos sobre quantias esdrúxulas, então temos um prejuízo enorme para prover onerosos julgamentos que não deveriam passar de conciliações das SEJUCs ou dos PROCONs. Agora some a essa cultura a eminência de novos direitos (Constituição Cidadã, Direito do Consumidor, Direitos/Proteção do Meio Ambiente, Direitos da Personalidade, Registros Público, Conceito de Família, Proteção/Direitos Coletivos), que é consequência direta do interesse estatal/burocrata de querer intervir em diversas questões, criando uma sobrecarga para o Judiciário e para a própria sociedade que precisa contribuir cada vez mais para sustentar o ciclo. Ah Bastiat, se tu soubesses o quanto estava certo...

Nessa brincadeira 109.1 milhões de ações passaram pelo judiciário só em 2016 (29.4 novos, 79.7 em trâmite). O número é tão absurdo que temos praticamente a relação de 1 processo a cada 2 brasileiros. Nossos 18.000 juízes mal conseguem dar baixa em processos na mesma proporção em que surgem novos. A consequência direta é o congestionamento da Justiça em todos os âmbitos (Federal, Estadual, Trabalhista) com reflexo direto na sociedade e economia do país.  No mundo inteiro a segurança jurídica está entre um dos principais fatores para a competitividade da indústria e no Brasil não seria diferente. A morosidade do judiciário causa prejuízos incalculáveis para o país quando empresas deixam de criar novos negócios, quando estas fecham não pela eficiência e competitividade mas sim pelos altos custos arrolados em processos que não se resolvem ou quando o capital estrangeiro foge para economias mais abertas e sistemas judiciários mais flexíveis e confiáveis. Os desdobramentos são conhecidos, mas vale o destaque: menos negócios, menos competitividade, menos empregos e já que que o empresariado precisa repassar esse custo através dos bens/serviços ofertados, temos de quebra um aumento de preços.

O Ministro Marco Buzzi conta que é de interesse do poder judiciário remover parte deste peso das costas do estado - ou melhor, da sociedade, dos contribuintes - e sugere a resolução de conflitos por meios alternativos, como a conciliação, algo amplamente preferível, fazendo com que inúmeras causas sejam resolvidas antes da judicialização, reduzindo assim o número de entradas e que ainda coloca mais liberdade na mão das partes, garantindo uma maior chance de não recorrência. A proatividade do judiciário através de manobras e mutirões foi outra sugestão levantada. Como na situação recente em que vários centros de distribuição dos Correios sofreram incêndios, já era esperado pedidos de ressarcimento em massa, logo seria mais vantajoso criar previamente uma organização em conjunto à estatal para receber estes pedidos para assim evitar inúmeras novas ações a posteriori.


Pela análise do CNJ é possível observar uma melhora anual na taxa de processos baixados, mas em contra partida o número de novos casos também cresce na mesma proporção, tornando inócuo qualquer melhora no número de pendências, mesmo com todo o esforço em busca de maior eficiência dentro dos tribunais. Logo, evitar novas entradas no judiciário e continuar otimizando a resolução de processos é o caminho óbvio para a problemática.

Mas apesar desta iniciativa de otimização por parte do judiciário, não podemos deixar fora da equação a responsabilidade do poder legislativo. Se a harmônia entre os poderes, como diz a constituição, fosse respeitada pelos burocratas que habitam Brasília, uma melhora no judiciário viria a largos passos. O brasileiro enquanto não aprender votar, fiscalizar e cobrar, vai continuar lotando o congresso de oportunistas, sugadores e corruptos. O interesse de intervir - e pra isso cria-se novas leis - é tão forte que tomamos como exemplo o surgimento de uma regulamentação que obriga o uso de faróis durante o dia, como se não bastasse as já inúmeras regulações desnecessárias. Não é possível exigir o funcionamento eficiente de um sistema judiciário que trabalha como se estivesse numa corrida para acompanhar, além do seu trâmite natural, todas as nuances de um legislativo pervertido.

Como já ultrapassamos qualquer razoabilidade em termos de tamanho de postagem, conclui-se que o problema do sistema judiciário e seu alto custo nada mais é que um reflexo do que acontece em todos os outros setores, onde também contribuímos muito e recebemos pouco. É preciso antes de tudo impedir o agigantamento do estado em nossas vidas ou iremos continuar sustentando um monstro que trilha o caminho do colapso, a cada novo dia pondo em risco o estado democrático de direito no Brasil.

Fonte/Dados: Justiça em Números (CNJ), 2017.

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